quarta-feira, 27 de dezembro de 2006

Feliz governo velho

Jeferson Miola, integrante do IDEA - Instituto de debates, estudos e alternativas de Porto Alegre

No primeiro dia de 2007 toma posse no Rio Grande um governo que nasce findo. O denominado “novo jeito de governar” revelou ainda cedo o que muito fora dito sobre si nas eleições: que inova unicamente na arte de ludibriar a sociedade através de fantasias fabricadas com o auxílio do marketing eleitoral. Nas eleições passadas, foi abundante o uso de bordões e clichês para mistificar a realidade e fraudar a vontade popular. O exagero no uso de fórmulas mistificadoras ficou evidente na comparação ridícula que os apoiadores da então candidata Yeda faziam entre ela e as heroínas Ana Terra e Anita Garibaldi!! [sic]

A governadora, logo que eleita, também revelou uma singular predisposição em produzir conflito e desagregação no interior da própria aliança partidária que a elegeu. Inclui-se aí o isolamento imposto ao vice-governador, preço pago pela sinceridade com que ele expõe seus propósitos políticos e sua visão programática. Nos últimos dias, dois “futuros” Secretários de Estado “se demitiram” antes mesmo de serem nomeados. Um prodígio inédito na política gaúcha.

Com a apresentação do pacotaço contendo medidas radicalmente contrárias às promessas de campanha, Yeda removeu o véu que encobria a última nesga do disfarce eleitoral do “novo jeito de governar”. A governadora quer impor mais do mesmo veneno: aumento cavalar de impostos, remoção de estímulos à agricultura e às exportações, arrocho do funcionalismo, aperto do custeio da saúde, educação, segurança e ao mesmo tempo a preservação de bilionários benefícios fiscais para um punhado de mega-empresas. Ao invés de induzir os setores dinâmicos e tradicionais para retomar o crescimento da economia gaúcha e assim recompor as finanças estaduais, a proposta tem um viés puramente fiscalista.

O pacotaço – com ou sem remendos - poderá ser aprovado na Assembléia Legislativa, onde a governadora possui maioria. Será, parafraseando o vice-governador Paulo Feijó, “um desastre; um erro estratégico de médio e longo prazo e causa da debandada de empresas e empregos do Rio Grande”. Os partidários do governo que nasce findo se apressam em mistificar novamente a realidade, desta vez sustentando a “inevitabilidade” das medidas – como se no período eleitoral a situação fosse diferente – e enaltecendo a “coragem” da governadora em aplicá-las.

Ninguém, mesmo apoiado em maioria parlamentar, no marketing e na propaganda entorpecente consegue, contudo, mistificar para sempre a realidade, a política e a história. As fórmulas agora defendidas como “inevitáveis, corajosas e heróicas” foram aplicadas desde sempre pelos mesmos personagens que hoje compõe o governo Yeda, e estão na raiz da grave crise da economia e das finanças gaúchas. Melhor seria para o presente e para o futuro do Rio Grande se não precisássemos nos deparar com um governo já obsoleto antes mesmo de ser empossado. É uma lástima.

Novo jeito de comprar

A governadora Yeda e sua aliança conservadora não estão inovando só na arte de ludibriar o povo.
Agora no Rio Grande quem compra bombacha recebe pantalha.

terça-feira, 26 de dezembro de 2006

Feijó avalia pacote do seu governo: desastre, erro estratégico, etc etc

O vice-governador eleito Paulo Feijó não economiza adjetivos para caracterizar o pacote encaminhado à Assembléia Legislativa a pedido da governadora eleita Yeda Crusius. Em entrevista à Rádio Gaúcha após a publicação do pacote [clique para acessar a página e selecionar a audição da entrevista], o vice-governador caracterizou o pacote como "desastre", "erro estratégico", "erro de médio e longo prazo", causa para a "debandada de empresas e empregos" do Rio Grande, proposta de burocratas que "nunca criaram um emprego e que não têm condições de dirigir o Estado", etc etc etc.
Só não comentou sobre a monumental fraude política que é a sua governadora e que foram as promessas feitas na eleição.

quinta-feira, 21 de dezembro de 2006

A deformidade dos salários

Jeferson Miola, integrante do IDEA - Instituto de debates, estudos e alternativas de Porto Alegre

No Brasil o salário mínimo do povo trabalhador e aposentado sofrerá um reajuste de 8,5% e atingirá o valor de R$ 380 a partir de abril de 2007. No mesmo Brasil, deputados federais e senadores se auto-concederam um reajuste de 91% no próprio salário, que passaria para R$ 24.500 não fosse a reação pública a essa indecência. Não se pode esquecer também que os edis se distinguem dos mortais por receberem 15 salários anuais, e não 13.

Com o aumento dos salários de deputados federais e senadores, aumenta automaticamente a remuneração dos deputados estaduais e vereadores de todo o país, vinculada constitucionalmente a de seus pares federais. Aumenta, em conseqüência, o enorme disparate entre a renda da população e daqueles eleitos para representá-la. Com o indecente aumento – indecente na forma privilegiada de legislar em interesse próprio e no valor fixado – os parlamentares buscam equivalência com os integrantes do Poder Judiciário, que já percebem salário de R$ 24.500.

A repulsa da sociedade à tentativa dos parlamentares deve servir para a reflexão sobre a verdadeira deformidade na remuneração do setor público processada ao longo de décadas. Como pode haver um teto salarial [que ao invés de teto funciona como remuneração efetiva] de R$ 24.500 no Judiciário se o mais importante funcionário público do País, eleito por 58 milhões de brasileiros/as, percebe cerca da metade deste valor?

Os privilégios no Legislativo, Judiciário e Ministério Público de arbitrar o próprio salário, independentemente da realidade nacional, criaram castas de funcionários públicos com salários muito superiores à média paga no Executivo. As enormes diferenças reproduzem a natureza desigual e injusta da sociedade brasileira, que ostenta a maior taxa de concentração de renda do mundo e a mais escandalosa desigualdade social e econômica.

Este momento de inquietação pública bem que podia estimular um movimento cívico para se discutir a fixação, por exemplo, de um teto salarial para todo o setor público em no máximo 30 vezes o valor do salário mínimo. Igualmente seria salutar para a democracia a discussão pública e transparente acerca dos salários pagos a funcionários de empresas estatais e em instituições financiadas com recursos do erário, como as do Sistema “S” e o Sebrae.

Os brasileiros que vivem com salário mínimo – aquelas 80% de famílias do nosso povo – poderiam confiar, desse modo, que o Brasil finalmente possa se encontrar com um destino de justiça e menos desigualdade.

[IN]Dignísima Mídia

Nunca a mídia brasileira ocupou o centro do debate público e da luta política como nas eleições gerais de 2006. Isso não quer dizer que no passado o comportamento da mídia tenha sido menos faccioso e partidário que neste ano. Muito ao contrário. A mídia monopolista e oligárquica brasileira, escorada nos esquemas do poder dominante, sempre esteve por trás dos importantes acontecimentos históricos da política no Brasil criando o “clima” na sociedade em favor das soluções dos poderosos: na campanha udenista que conduziu Getúlio Vargas ao suicídio, na desmoralização implacável de JK, na tentativa de impedir a posse de Jango em 61, no golpe militar de 64, no acobertamento da repressão durante a ditadura, no acordo conservador no Congresso contra as DiretasJá, na manipulação para eleger Collor de Mello em 89, na blindagem do desastre neoliberal tucano-pefelista durante 8 anos, para fixar citações mais emblemáticas.

A diferença, neste ano, é que a mídia “saiu do armário” por inteiro. Atuou como projeto político-partidário com lado definido e objetivo claro de combater a esquerda, os setores progressistas e todos aqueles que representam algum obstáculo aos seus interesses. Substituiu o jornalismo pela publicidade vil contra seus adversários. Criou bordões e clichês que foram convertidos em palavras de ordem do conservadorismo. Subverteu as normas jurídicas do Estado democrático de direito segundo as quais cabe ao acusador o ônus da prova, impondo aos que acusou levianamente o ônus de provar a própria inocência. Militou abertamente na campanha de Alckmin – levando a eleição presidencial para o segundo turno – e de candidatos aos governos estaduais.

A esta extraordinária ousadia e petulância da mídia oligárquica do Brasil, tendo a Rede Globo e suas afilhadas à frente, correspondeu também a mais fantástica derrota já imposta à própria mídia pela opinião pública, pois a imensa maioria pobre do país soube discernir o que estava em jogo.

A revista Carta Capital, ainda durante o processo eleitoral, em três reportagens de Raimundo Pereira desnudou a trama montada pela Rede Globo para derrotar Lula, favorecer Alckmin e impulsionar a aliança conservadora tucano-pefelista em todos os estados do país. A carta de demissão do repórter Rodrigo Viana [clique para ler] da Rede Globo, publicada por esses dias de dezembro, comprova o quão grave foi a atitude editorial da império das comunicações do Brasil.

Também durante as eleições aconteceu uma verdadeira insurgência eletrônica através da internet com listas de discussão, contra-informação, redes de e-mails e principalmente blógues pessoais e de colunistas políticos isentos e honestos.

No âmbito estadual, foi no Paraná que houve o enfrentamento mais consciente e sistemático do papel desempenhado pela imprensa durante as eleições. Após a eleição para o exercício do segundo mandato à frente do governo paranaense, conquistado apesar da férrea campanha em contrário da imprensa local, o Governador Roberto Requião apresentou o balanço A IMPRENSA DO PARANÁ E A ELEIÇÃO [clique para ler o texto na íntegra]. É um documento com informações objetivas a respeito da cobertura da imprensa e da editorialização feita pela mídia paranaense contra o Governador Roberto Requião e a favor do candidato Osmar Dias.

Quem formula esta análise faz parte de um time vencedor, portanto não se trata de “choro de derrotado”, mas antes disso uma advertência acerca da lacuna existente na sociedade brasileira, em que a atuação descontrolada e anti-republicana de certa [IN]Digníssima Mídia pode comprometer a própria democracia no Brasil. É uma contribuição da experiência do Paraná para que a sociedade brasileira possa dar passos decisivos no sentido da democratização, desconcentração e moralização da imprensa no país.

Em uma série de mais quatro notas sobre a [IN]Digníssima Mídia além dessa, Biruta do Sul publicará correspondências de Benedito Pires Trindade, Secretário de Imprensa do Paraná, que documentam a guerra ocorrida naquele Estado da Federação.

Quando o passado não é história

Domingo, dia 17 de dezembro, o filho gremista pergunta para o pai, também gremista:
- Pai, porque os colorados estão comemorando?
- Porque eles foram campeões do mundo, diz um conformado pai.
- Mas pai, nós também somos campeões do mundo, né?
- Sim!, exclama imediatamente um animado pai. Ao fundo, foguetório.
- Pai, tem vídeo teu no youtube na comemoração e fotos da festa do Mundial?
- Não, guri. Naquela época não existia youtube e câmera digital. Aliás, nem internet tinha.
- Não???? Bah, que estranho... E o Inter ganhou do Barcelona, aquele time que vemos todos os domingos na tv, né? E nós, de quem ganhamos?
- Do Hamburgo, 2x1 na prorrogação.
- Hamburger? Que time é este?
- HamburGO. Na época era o campeão europeu.
- E depois?
- Nunca mais ganhou nada, hoje é time médio na Alemanha. Eles foram com time misto, tavam mal no Alemão.
- Mas eram bons? Tinham craques que nem o Ronaldinho, o Deco, o Eto'o?
- Claro, tinha o... Rollf e o Magath!

Confuso, mas confiando no pai, o guri diz: - Hm, tá bom... Ah, este Hamburger era que nem o Once Caldas da Colômbia, né?
- Como você pergunta coisas! Já falei que é HAMBURGO, com GÊ-Ó no final! O que mais tu quer saber, hein?
- Contra quem jogamos nas semifinais? Um time da Ásia?
- Não, guri. Na época não tinha isto, era um jogo só da Europa contra a América do Sul.
- Hm, entendi.. Então na época, só haviam descoberto dois continentes?
- Mas saco (nesta hora o pai já está bem irritado com o interrogatório)! Não, é que não tinha representantes dos outros continentes. Era só 1 jogo, e só entre eles.

Tentando amenizar, mas muito curioso ainda , o menino pergunta: - Pai, tem imagem de TV da entrega da nossa taça do Mundial?
- Tenho! Peraí, tenho que pegar o videocassete betamax que tá no sótão e instalar na TV velha da sala. O pai vai rápido, todo feliz e instala em 10 minutos. A imagem tá ruim, mas dá para ver a entrega direito.

Neste momento, passa uma horda de colorados na frente do prédio gritando: "colorado, colorado: nada vai nos separar..."

- Pai, quem é este japonês que tá entregando a taça pro nosso time? Era o presidente da FIFA na época? Quem era antes do Blatter?
- Hmm, não lembro. Deixa eu ver o que tá escrito na tela. Ah, tá ali. "Toyota Maintenance Manager", então é o Gerente de Manutenção da Toyota.
- Entendi tudo então pai! Então quer dizer que também somos campeões do mundo, mas na época não tinha internet nem câmera digital, e gravado em um sistema que não existe mais. Que ganhamos de um time que era zebra na Europa, que não tinha semifinal e o mundo do futebol só tinha dois continentes. E que o prêmio pela conquista foi entregue por um funcionário subalterno da patrocinadora do jogo...

O pai suspira, escutando pela milésima vez ao fundo ".. o teu presente diz tudo, trazendo a torcida alegres emoções..." e diz: "é, vai ser difícil convencer o outro..."

Auxílio ao turista




terça-feira, 19 de dezembro de 2006

"Rede Globo defende Platão, mas detesta Freud!"

Platão foi assessor do Ministério da Saúde na época tucana de José Serra/Barjas Negri, e esteve implicado com a máfia das ambulâncias, a famiglia Vedoin e Abel Pereira. Os chefes da Rede Globo, porém, preferiram ocultar do distinto povo brasileiro a existência de Platão e seus laços obscuros.
Ma a Rede Globo não poupou Freud, incriminado sem cometer crimes e jogado à opinão pública como alguém que deveria provar inocência até prova em contrário.
A revelação é do repórter Rodrigo Viana, que pediu demissão da Rede Globo e denunciou, em carta [leia aqui], a trama montada pelo império televisivo para levar a eleição ao segundo turno e tentar derrotar Lula.

segunda-feira, 18 de dezembro de 2006

“Nós, contra o homem da Globo”

Estará em Porto Alegre nesta terça-feira 19/12 o autor das reportagens da revista Carta Capital denunciando a trama montada pela Rede Globo para levar a eleição presidencial ao segundo turno.

Raimundo Pereira, um nome identificado com a história da mídia alternativa no país durante o período militar [Opinião, Movimento], participará do simpósio Ângulos da cena brasileira em análise, que acontecerá na Casa dos Bancários - Rua General Câmara [Rua da Ladeira], nº 424. Atualmente, Raimundo faz parte da Revista Reportagem / Oficina de Informações, uma publicação mensal que se diferencia pela qualidade e radicalidade das análises. No saite da Oficina se encontra, por exemplo, a matéria Nós, contra o homem da Globo, “a história da formidável peleja entre os ‘nanicos’ Antônio Carlos Queiroz e Raimundo Rodrigues Pereira contra Ali Kamel, diretor-executivo de jornalismo da Central Globo de Jornalismo, gigante da mídia brasileira.”.

Em síntese: Raimundo Pereira participa do simpósio Ângulos da cena brasileira em análise, 19/12 às 19 horas, na Casa dos Bancários.

Anistia não é amnésia

Porto Alegre foi a primeira cidade do país a sediar uma manifestação de homenagem às famílias de Criméia Almeida e César e Maria Teles, que processam judicialmente o coronel aposentado Carlos Alberto Brilhante Ustra pela prática de tortura no período em que coordenou o DOI/CODI em São Paulo, durante a ditadura militar. Em edições anteriores do Biruta do Sul pode-se encontrar mais detalhes sobre a ação declaratória impetrada contra o torturador e seus significados para a revisão do absurdo benefício de indulto concedido aos agentes da repressão.

O deputado petista Raul Pont, cuja proposta de realização do evento foi acolhida por várias organizações civis, instituições públicas e partidos políticos, criticou a cobertura “desmemoriada” e conivente da mídia que reproduz a falsidade do torturador Brilhante Ustra, que se diz vítima de calúnia e difamação neste processo. Recentemente, o torturador esteve em Porto Alegre lançando o livro com sua versão e muitas mentiras sobre os fatos. Procedimento, aliás, idêntico ao do ditador Pinochet, que em entrevista revelada após sua recente morte diz que “nunca ordenou que fosse feito o mal” [sic].

Raul Pont lembrou que Brilhante Ustra, quando exercia o cargo de adido militar do Brasil em Montevidéo nos anos iniciais do governo Sarney, foi denunciado pela atriz e ex-deputada Bete Mendes como sendo um dos seus algozes. A denúncia de Bete Mendes foi propagada pela mídia alternativa na época, ganhando destaque no jornal Em Tempo [exemplar levado por Raul ao evento, na foto ao lado] e foi objeto de um duro pronunciamento de Raul na tribuna da Assembléia Legislativa gaúcha.

Maria Amélia, Criméia e César lembraram, em depoimentos emocionantes, que a Lei de Anistia beneficia somente os presos políticos, que foram julgados e condenados, tendo a pena anulada após a promulgação da Lei em 1979. Os torturadores, ao contrário, não têm direito aos benefícios previstos na Lei de Anistia, e devem ser julgados pelos cruéis crimes praticados. Esta tem sido a trilha que todas sociedades latino-americanas estão adotando. Com a contribuioção desta ação declaratória, o Brasil dá um passo importante na construção da verdadeira história do país.

*** *** ***

Texto publicado no Painel do Leitor da Folha de S.Paulo de 29/11/06 por Edson Luis de Almeida Teles:

“Tortura

‘O artigo de Jarbas Passarinho ("A tortura e o terrorismo", "Tendências/ Debates", 28/11) obriga-me a prestar um testemunho de infância. Sou "obrigado", porque o faço com pesar, pois não me é fácil expor estes sentimentos.

Fui preso, aos 4 anos de idade, em minha casa. Assistia ao "Vila Sésamo", programa infantil na TV, e fui interrompido pelos agentes do senhor Ustra, diga-se do DOI-Codi, que invadiram nossa casa com suas metralhadoras e palavras ofensivas.

Estávamos eu, minha irmã de 5 anos e minha tia, grávida de sete meses. Colocaram-nos no camburão e nos levaram ao "escritório" deste cidadão que hoje dá-se a escrever livros falseando sobre parte das mais horríveis na história do Brasil.

dentro do DOI-Codi, fui levado a um lugar onde pude ver meus pais torturados. Por uma janelinha, a voz materna que meus ouvidos estavam acostumados a escutar me chamava. Porém, quando eu olhava, não podia reconhecer aquele rosto, verde/arroxeado pelas torturas que o oficial do Exército, coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, havia infligido à minha mãe.

Era ela, mas eu não a reconhecia. Essa cena eu não esqueço, não porque arquitete uma vingança imaginária contra o coronel Ustra.

Ela não é uma informação da qual disponho, mas uma marca que talvez por meio da terapia de meu testemunho público possa acalmar, deslocar para espaços periféricos de minha memória. Reitero minha confiança na Justiça de conquista de uma reparação histórica e moral.

Prefiro, como fez José Carlos Dias, o testemunho que vale a memória. Pelo direito à verdade!’

EDSON LUIS DE ALMEIDA TELES, um dos autores do processo da família Teles contra o coronel Ustra (São Paulo, SP)

domingo, 17 de dezembro de 2006

O mundo é vermelho ...

SC Internacional de Porto Alegre, campeão mundial interclubes de 2006.

"Sirvam nossas façanhas
De modelo a toda a terra"

sexta-feira, 15 de dezembro de 2006

Ângulos da cena brasileira em análise

A eleição presidencial de 2006, principalmente durante o segundo turno, evidenciou alguns aspectos que marcarão o conflito político e de classes no Brasil no próximo período. Se sobressaem [1] o comportamento parcial e tendencioso da mídia, [2] a pregação odiosa da direita e a vilania contra Lula, o PT e as forças populares, [3] a deslegitimação do animus golpista em razão da formidável vitória de Lula e [4] a interpelação popular e anti-neoliberal do discurso de Lula nas eleições.

Além disso, a derrota do conservadorismo e da direita brasileira foi acompanhada da mais espetacular derrota da mídia no Brasil, inexitosa na tentativa de manipulação do debate público à feição do udenismo ressuscitado. A consciência do povo brasileiro acerca das melhorias propiciadas pelo governo Lula – ainda que limitadas e contraditórias – não foi entorpecida pela mídia e menos ainda escravizada pelo poder oligárquico.

A partir desses pressupostos, o simpósio Ângulos da cena brasileira em análise buscará refletir sobre as tarefas postas para a esquerda no segundo governo Lula e, principalmente, sobre as perspectivas para a realização das reformas sociais urgentes e necessárias em meio às tensões e contradições intrínsecas a um governo de coalizão.

Segundo governo este que se desenrola num cenário continental e internacional mais favorável ao avanço da consciência cívica mundial de oposição à hegemonia norte-americana e ao neoliberalismo e propício à maior integração de projetos solidários entre os povos.

Os conferencistas do simpósio serão Dilermando Toni – PcdoB, Miguel Rossetto – PT, Raimundo Pereira – Revista Reportagem e Roberto Amaral – PSB.

O simpósio acontece na próxima terça 19/12 às 19 horas na Casa dos Bancários, sendo uma realização do IDEA – Instituto de debates, estudos e alternativas de Porto Alegre e SindBancários - Sindicato dos Bancários de Porto Alegre com o apoio do SINTRAJUFE/RS, CPERS, Federação dos Bancários e CUT/RS.

Acontece em Porto Alegre para que nunca mais aconteça na história da humanidade

Na próxima segunda 18/12 ocorrerá um ato de homenagem à família Teles, que promoveu ação judicial declaratória contra o torturador Brilhante Ustra. Biruta do Sul publicou vários apontamentos sobre o assunto, que podem ser revistos no índice ao lado em 12set e de 24nov avaliando os significados desta inédita ação para o debate acerca dos crimes da repressão no Brasil.

A homenagem acontece na Casa dos Bancários às 17h de segunda, sendo promovido por vários partidos políticos, organizações civis, associações de mortos e familiares de desaparecidos, parlamentares e instituições públicas.

Deputação ou depravação?

Depois do hercúleo e heróico esforço para aumentar em OITO REAIS o salário mínimo do povo brasileiro [que passará de R$ 367 para R$ 375], as excelências legislativas “das Brasília” se auto-concederam um aumento de ONZE MIL SEISCENTOS E CINQUENTA E TRÊS REAIS, de molde que o “subsídio” mensal dos deputados e senadores passará de R$ 12.847 para R$ 24.500.

Com o merecido aumento do “subsídio” mensal, nos quatro anos da próxima legislatura as excelências legislativas “das Brasília” receberão R$ 1.470.000 - contando, além do “subsídio” mensal, a regalia de mais três “subsídios” no ano e não se considerando as demais regalias indiretas do mandato. Os ONZE MIL SEISCENTOS E CINQUENTA E TRÊS REAIS significarão R$ 699.180 a mais no bolso das excelências legislativas “das Brasília” nos próximos quatro anos.

Por outro lado, o povo brasileiro do salário mínimo, agraciado por seus representantes parlamentares com um aumento de OITO REAIS, ao cabo dos próximos quatro anos [período de duração do mandato das excelências legislativas “das Brasília”] terá embolsado R$ 19.500 de salários, aí considerado o percebimento do 13º. Com o generoso aumento de OITO REAIS concedido pelos seus representantes parlamentares, o povo brasileiro embolsará R$ 416 a mais nos próximos quatro anos.

A decisão conjunta adotada pelas mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, de tão obscena, deve promover uma reforma na língua portuguesa, reconhecendo a sinonímia entre as palavras deputação e depravação [e, por extensão, entre deputado e depravado], incorporando nessa categoria os/as nobres senadores/as.

A decisão das excelências legislativas “das Brasília” é motivo de alegria, alegria na Assembléia Legislativa gaúcha, cujo “subsídio” mensal dos parlamentares passará automaticamente para R$ 18.300, sem necessidade de decisão e/ou votação, pois os edis anteriormente agiram com sabedoria, estabelecendo a vinculação dos seus ganhos em 75% do que recebem as excelências legislativas “das Brasília”. Aumentou lá, aumenta cá!! Quem sabe não seja este um motivo a ser comemorado pelo povo gaúcho do salário mínimo, que poderá ser agraciado com a ampliação da rede de albergues no Estado.

Em artigo na Carta Maior, Marco Weissheimer pergunta: Alguém aprendeu algo com a crise política?. Leia o artigo e responda à pergunta.

quinta-feira, 14 de dezembro de 2006

Inaugura na bela e doce capital

Amanhã, 15/12 às 18:30 horas haverá a inauguração de novo espaço cultural em Porto Alegre, o Mundo Paralelo, que terá café, bar e loja de empreendimentos da economia popular e solidária. O Mundo Paralelo se localiza na Casa dos Bancários, a sede do Sindicato dos Bancários que está abrigada no antigo casarão restaurado na Rua da Ladeira [General Câmara] número 424.
Com este novo investimento que se incorpora ao já existente auditório, a Casa dos Bancários tem tudo para se tornar um importante centro político, cultural, intelectual e social da bela e doce capital de todos/as os/as gaúchos/as. A diretoria do Sindicato pretende concluir no próximo ano a Sala de Exibições, com capacidade para 98 lugares.
Vida longa à Casa dos Bancários. Vida longa ao Mundo Paralelo - e que seja infinitamente melhor que o atual.

quarta-feira, 13 de dezembro de 2006

Agora só falta o Britto ...

Apesar da reiterada insinceridade da governadora eleita Yeda Crusius, desde que o mundo é mundo se sabia que os disfarces utilizados por ela na eleição - “novo jeito de governar” e “choque de gestão” – não passavam de truque eleitoral.

A poucos dias da posse, a fotografia do governo está praticamente completa, e revela que Yeda foi mais realista que a rainha. Na reedição do velho modo neoliberal de destruir, entregará áreas importantes para figurinhas manjadas que fizeram parte do governo Britto – Berfran, Proença, Bonow, ... Britto, bem lembrado, foi aquele governador que destruiu o Estado privatizando funções públicas [pedágios], entregando patrimônio estatal, doando dinheiro público para transnacionais e demitindo massivamente funcionários de funções essenciais.

Britto tem sua trajetória marcada pela destruição: depois do Estado do Rio Grande, devastou fábricas e empregos da mega-indústria de calçados que presidiu. Hoje, sem ocupação definida, poderá ser uma alma a rondar outra vez a atmosfera do Piratini.

Parafraseando Pagina/12, Biruta do Sul deixa uma pergunta perturbadora: o quê haverá feito o povo gaúcho para merecer isso?!?!?!

Acontece na bela e doce capital

Desde o último 11/12 até 16/12 acontece em Porto Alegre a 8ª Feira Estadual de Economia Popular Solidária. A feira congrega produtores/as associados/as, cooperativados/as, individuais, agricultores/as e “agroindustriais” familiares de várias regiões do Rio Grande, oferecendo principalmente alimentos, artesanato, bebidas, vestuário a preços honestos e qualidade certificada.
Vale conferir a Feira, que acontece no Largo Glênio Peres, das 8:30h às 20h.

Avermelhando o planeta ...

Vêm do oriente os ventos que colorem de vermelho o planeta ...
Vâmo vâmo Inter!!!

Quá Quá Quá!!! Com gol do Pato!!!

terça-feira, 12 de dezembro de 2006

Não precisa ser, mas tem de ter gratidão

O presidente Lula até pode, de fato, não se considerar alguém de esquerda, muito embora o governo por ele capitaneado - com todos limites, contradições e avanços – ainda tem situado o Brasil à esquerda na política internacional e diminuído as desigualdades e injustiças sociais no plano interno.

É certo que a esquerda não-dogmática do país – de inserção social, partidária ou intelectual - tem demonstrado sapiência e noção estratégica para compreender perfeitamente a complexidade do momento histórico e saber discernir de que lado o jogo deve ser jogado.

Até por isso o presidente poderia expressar melhor gratidão pela esquerda, esta condição honrosa que para muitos independe de idades, gerações e principalmente de circunstâncias. Afinal, foram os valores, os compromissos e o discurso de um mundo melhor, portados pela esquerda, que o elegeram presidente para mudar o Brasil. Duas vezes.

Enquanto isso, nas portas do inferno ...


Gilberto Maringoni, uma dessas maravilhosas obras do cartunismo brasileiro, flagrou o rebuliço no inferno causado pela notícia da chegada do sanguinário Pinochet. A charge do Maringa está acompanhada de ótimas notícias no saite da Carta Maior.

¿QUE HABRÁ HECHO EL INFIERNO PARA MERECER ESTO?

Uma das manchetes mais inspiradas ontem foi do diário argentino Página/12, sugerindo que ainda está por existir um lugar para abrigar o facínora Pinochet. Nem para o inferno o sanguinário merece ir.

Quando da morte do ditador argentino Leopoldo Galtiéri em janeiro de 2003, o título de capa do Página/12 foi “Sólo llora Johnnie Walker”, numa clara alusão ao alcoolismo que marcou a vida do sanguinário ditador ao lado da crueldade da repressão. Numa matéria de dentro do jornal, outro título inspiradíssimo daquela edição do Página/12: “Murió el amigo del whisky y la tortura.

Santa diferença do Página/12 em relação à mídia tupiniquim!!!


segunda-feira, 11 de dezembro de 2006

Governo de coalizão precisa da força do povo

Jeferson Miola, integrante do IDEA – Instituto de debates, estudos e alternativas de Porto Alegre - jmiola@uol.com.br


A semana que passou foi grifada com uma significativa derrota política do governo Lula, que amargou a eleição do deputado pefelista Aroldo Cedraz [afilhado político de ACM] para o cargo de Ministro do Tribunal de Contas da União [TCU]. No mínimo, foi uma derrota da crença do governo em buscar obsessivamente maioria congressual sem politizar a relação com a ampla maioria social que o elegeu.

Lula pertence à rara galeria de governantes mundiais que ostenta um portfólio de quase 60 milhões de sufrágios populares e uma das maiores votações proporcionais já obtidas no planeta com 61% da preferência do eleitorado nacional. Entretanto, este capital social e eleitoral parece valer pouco na definição da estratégia de sustentação do governo com vistas à implementação das reformas democráticas e populares que o Brasil necessita.

Nesses dias em que a humanidade se livra para sempre do facínora chileno [Pinochet], nunca é demais lembrar a importância de que governos progressistas e de esquerda combinem [i] a adesão do povo que almeja mudanças com o [ii] equilíbrio institucional amplo, que inclui arranjos parlamentares para constituição de maiorias.

Todas as sinalizações de Lula e do PT para a montagem do segundo governo, todavia, evidenciam a persistência do mesmo erro cometido durante o primeiro mandato, em que a governabilidade foi concebida fundamentalmente nos limites da relação com o Congresso Nacional. Não houve equilíbrio [e poderá não haver no segundo mandato] entre a busca de maioria parlamentar e a implementação de formas de deliberação pública e de comprometimento programático na sociedade que poderia ocorrer, por exemplo, com mecanismos de democracia participativa e de outros canais de participação social e de interlocução com os movimentos sociais e de relação com demais agentes políticos sub-nacionais.

A derrota sofrida pelo governo na indicação do Ministro do TCU pode ser encarada como sinal da desarticulação do PT no Congresso e da barganha da base aliada nas negociações, mas não pode ser recusada enquanto demonstração dos limites de compromissos dos setores partidários da aliança formada no governo de coalizão. Não pode haver confiabilidade absoluta nessa sustentação congressual pelo simples fato de que não haverá 100% de fidelidade dos novos aliados com as propostas do governo - mesmo que hoje a feitura das alianças ocorra a partir da pactuação transparente e de “bases programáticas” [expressão de dirigentes do PT], porque são grandes as contradições programáticas com os partidos da coalizão.

Alianças parlamentares para sustentação de um governo de esquerda se justificam quando ajudam a concretizar os compromissos programáticos e as mudanças que superem as desigualdades e as graves injustiças sociais do país. Podem ser mediações políticas que ajudam a concretizar o projeto do governo; mas jamais se pode iludir com a idéia de que após constituídas se bastam em si mesmas. É essencial, junto com a viabilização de maioria de apoio do governo no parlamento, o estabelecimento de estratégias de irradiação da participação popular nos rumos e no controle do governo e do Estado.

O povo organizado, consciente e participante pode ser o aliado fundamental para que o parlamento e os parlamentares possam desenvolver políticas de interesse do país e da maioria da sociedade. O povo pode ser, também, o mais fiel sujeito político capaz de obstruir as tentativas da direita e do conservadorismo em desestabilizar e destituir o governo Lula. Se não existir equilíbrio entre a sustentação congressual e a relação organizada com a sociedade, o governo poderá ter prejuízos importantes. No primeiro mandato, mesmo sem nunca ter necessitado maioria de 2/3 no Congresso o governo cedeu tudo à chamada base aliada, que não evitou a derrota para a presidência da Câmara dos Deputados e também não impediu as CPI´s ilegais montadas pelo conservadorismo tucano-pefelista para atacar implacavelmente Lula e o governo com o apoio do oligopólio midiático. Esta é uma lição que deve ser levada em consideração.

La muerte de un canalla

Por Mario Benedetti
Domingo, 10 de diciembre de 2006

Los canallas viven mucho, pero algún día se mueren

Obituario con hurras
Vamos a festejarlo
vengan todos
los inocentes
los damnificados los que gritan de noche
los que sueñan de día
los que sufren el cuerpo
los que alojan fantasmas
los que pisan descalzos
los que blasfeman y arden
los pobres congelados
los que quieren a alguien
los que nunca se olvidan
vamos a festejarlo
vengan todos
el crápula se ha muerto
se acabó el alma negra
el ladrón
el cochino
se acabó para siempre
hurra
que vengan todos
vamos a festejarlo
a no decir
la muerte
siempre lo borra todo
todo lo purifica
cualquier día
la muerte
no borra nada
quedan
siempre las cicatrices
hurra
murió el cretino
vamos a festejarlo
a no llorar de vicio
que lloren sus iguales
y se traguen sus lágrimas
se acabó el monstruo prócer
se acabó para siempre
vamos a festejarlo
a no ponernos tibios
a no creer que éste
es un muerto cualquiera
vamos a festejarlo
a no volvernos flojos
a no olvidar que éste
es un muerto de mierda.

domingo, 10 de dezembro de 2006

Estadio Chile

Em 12 de setembro de 1973, no dia seguinte ao golpe militar, o músico Victor Jara foi preso na Universidade onde trabalhava e levado diretamente para o Estádio Nacional do Chile, onde foi torturado, ultrajado, teve as mãos amputadas e foi finalmente fuzilado quatro dias depois.

Durante os poucos dias em que esteve confinado no Estádio, escreveu o poema que foi levado por companheiros soltos para sua esposa Joan Jara:

Somos cinco mil
en esta pequeña parte de la ciudad
Somos cinco mil
¿Cuántos seremos en total
en las ciudades y en todo el país?
Sólo aquí, diez mil manos que siembran
y hacen andar las fábricas.

¡Cuánta humanidad
con hambre, frío, pánico, dolor,
presión moral, terror y locura!

Seis de los nuestros se perdieron
en el espacio de las estrellas.

Un muerto, un golpeado como jamás creí
se podría golpear a un ser humano.
Los otros cuatro quisieron quitarse todos los temores
uno saltando al vacío,
otro golpeándose la cabeza contra el muro,
pero todos con la mirada fija de la muerte.
¡Qué espanto causa el rostro del fascismo!
Llevan a cabo sus planes con precisión artera
sin importarles nada.
La sangre para ellos son medallas.
La matanza es acto de heroísmo.
¿Es éste el mundo que creaste, Dios mío?
¿Para esto tus siete días de asombro y de trabajo?
En estas cuatro murallas sólo existe un número
que no progresa,
que lentamente querrá más la muerte.

Pero de pronto me golpea la conciencia
y veo esta marea sin latido,
pero con el pulso de las máquinas
y los militares mostrando su rostro de matrona
lleno de dulzura.

¿Y México, Cuba y el mundo?
¡Que griten esta ignominia!
Somos diez mil manos menos
que no producen.
¿Cuántos somos en toda la Patria?
La sangre del compañero Presidente
golpea más fuerte que bombas y metrallas.
Así golpeará nuestro puño nuevamente.

¡Canto que mal me sales
cuando tengo que cantar espanto!
Espanto como el que vivo
como el que muero, espanto.
De verme entre tanto y tantos
momento del infinito
en que el silencio y el grito
son las metas de este canto.
Lo que veo nunca vi,
lo que he sentido y lo que siento
hará brotar el momento...

Um facínora que se vai

O ditador golpista Augusto Pinochet morreu com o privilégio de não ter nenhum ajuste de contas com a justiça chilena. Com a morte do sanguinário ditador, se foi um dos piores facínoras latino-americanos ainda remanescentes. Ele se foi, contudo, sem pagar um segundo da sua vida com uma condenação merecida, devida, porém nunca recebida.

Mas se não foi julgado e condenado, pelo menos a morte do ditador não significa o esquecimento ou o indulto eterno pela barbárie praticada. Perdoar ou indultar o facínora [e todos repressores da sua laia que agiram nos países do nosso continente] é tão criminoso quanto o crime bárbaro que foi cometido por ele [e os da sua laia] contra seu próprio povo.

A presidenta chilena Michele Bachelet, cujo pai foi morto pela repressão de Pinochet, não concederá ao ditador honras de Estado na cerimônia de sepultamento. A declaração do governo brasileiro, de outra parte, é elogiável por relembrar o pesadelo histórico do período da ditadura chilena, e também por não reconhecer Pinochet como alguém que mereça manifestação solene de parte do Estado brasileiro.

Com o avanço das esquerdas no continente latino-americano, cresce a consciência histórica de que é fundamental o julgamento dos crimes da repressão do passado para um futuro de reconciliação. Oxalá seja o destino desejado por Salvador Allende em seu último pronunciamento feito na Rádio Magallanes instantes antes de sua morte no 11 de setembro de 1973:

Trabajadores de mi patria: Tengo fe en Chile y su destino. Superarán otros hombres este momento gris y amargo, donde la traición, pretende imponerse. Sigan ustedes, sabiendo, que mucho más temprano que tarde, de nuevo, abrirán las grandes alamedas por donde pase el hombre libre, para construir una sociedad mejor.

sábado, 9 de dezembro de 2006

Michael Moore envia carta ao povo e ao Congresso dos Estados Unidos

Michael Moore, conhecido cineasta estadunidense autor de Tiros em Columbine e Fahrenheit 9/11 dentre outras importantes produções cinematográficas, publicou no seu saite [www.michaelmoore.com] uma carta enviada ao Congresso e ao povo dos Estados Unidos exigindo a retirada das tropas estadunidenses de ocupação do Iraque, bem como o pagamento de indenizações ao Iraque.

Michael Moore é uma das vozes mais críticas ao governo de George W. Bush Júnior [ou Mister Danger, como se refere a ele o Presidente Hugo Chávez] e com sua atuação desempenha um papel importante na formação de uma consciência alternativa no reino da alienação. Adiante, a carta:


Amigos,

Hoje (27/11) marca o dia em que permanecemos no Iraque mais tempo que aquele que levamos para combater na Segunda Guerra Mundial.

É isso mesmo. Nós fomos competentes para derrotar a Alemanha Nazista, Mussolini e o Império Japonês inteiro em menos tempo que a única superpotência mundial gastou para tentar tornar segura a estrada que liga o aeroporto de Bagdá ao centro da cidade.

E nós não conseguimos fazer isso. Após 1.437 dias, no mesmo tempo que levamos para irromper pela África do Norte, conquistar as praias da Itália, conquistar o Pacífico Sul e libertar toda a Europa Ocidental, nós não pudemos, após 3 anos e meio, conquistar sequer uma simples estrada e proteger a nós mesmos de bombas caseiras, feita de latinhas, colocadas em buracos nas rodovias. Sem contar que uma viagem de táxi do aeroporto até Bagdá, de 25 minutos, custa 35 mil dólares e o motorista não te dá sequer um mísero capacete para sua proteção.

A culpa desse fracasso se deve a nossas tropas? Dificilmente. Não importa o quanto de tropas, de helicópteros ou de democracias nos cuspamos das nossas armas, nada irá "vencer, a guerra no Iraque". Ela é uma guerra perdida. Perdida porque jamais teve o direito de ser vencida, perdida porque começou por homens que jamais estiveram em uma guerra, homens que se escondem atrás daqueles que foram enviados para lutar e morrer..

Vamos ouvir o que o povo iraquiano está dizendo, de acordo com uma pesquisa recente feita pela Universidade de Martland:

- 71% de todos os iraquianos querem os EUA fora do Iraque.

- 61% de todos os iraquianos apóiam os ataques da resistência contra as tropas americanas.

Sim, a vasta maioria dos cidadãos iraquianos acham que nossos soldados devem ser mortos e massacrados! Então, o que diabos nós ainda estamos fazendo lá? Vamos interpretar como se não tivessemos compreeendido a deixa? Existem diversos modos de libertar um país. Freqüentemente os cidadãos se rebelam e se libertam a si próprios. Foi assim que nós fizemos.

E você também pode fazer isso de modo não violento, usando a desobediência civil. Foi assim que a Índia fez.

Você pode também fazer com que o mundo inteiro boicote o regime de um país até que ele caia no ostracismo e capitule.

Foi isso que aconteceu com a África do Sul.

Ou, você pode simplesmente esperar que eles cansem e caiam fora, cedo ou tarde, como as legiões do rei fizeram (Algumas só porque estavam com muito frio). Isso aconteceu no vizinho Canadá.

O único modo que não funciona é invadir um país e dizer a seu povo "Estamos aqui para libertar vocês", enquanto eles não faziam nada para libertar-se.

Onde estavam todos esses homens suicidas enquanto Saddam Hussein oprimia o povo? Onde estavam os "insurgentes" que plantam bombas nas estradas quando o comboio do maligno Saddam Hussein passeava por elas? E acho que o velho Saddam era um déspota cruel - mas não tão cruel a ponto de milhares arriscarem seus pescoços contra ele.

"Ah não Mike, eles não podiam fazer isso! Saddam os mataria!" Sério? você acha que o rei George não mataria quem se insurgisse contra ele? Você acha que Patrick Henry e Tom Paine tinham medo? Isso não os impediu de lutar.

Quando dezenas de milhares de pessoas não têm a inclinação de sair às ruas e derramar seu sangue para remover um ditador, isso deve servir como uma boa pista de que eles não estão desejando participar de alguma libertação promovida de fora.

Uma nação pode ajudar outro povo a remover um tirano (Foi o que os franceses fizeram por nós em nossa revolução), mas depois disso, você cai fora. Imediatamente! Os franceses não ficaram e nos disseram como deveriamos constituir nosso governo.

Eles não disseram "não estamos indo embora porque nós queremos os seus recursos naturais".

Eles nos deixaram à nossa própria sorte e nós levamos seis anos para fazer uma eleição depois da partida deles.

E daí tivemos uma sangrenta guerra civil. Isso foi o que aconteceu e a História está cheia desses exemplos. Os franceses não disseram: "Oh, é melhor ficar na América, de outro modo eles vão se matar uns aos outros discutindo essa história de escravagismo".

O único caminho que leva uma guerra de libertação ao sucesso é ter por trás dela o apoio de seus próprios cidadãos - e um numeroso grupo de Washingtons, Jeffersons, Franklins, Gandhis e Mandelas liderando a insurreição. Onde estão esses faróis da liberdade no Iraque? Essa é uma piada e tem sido uma piada desde o início. Sim, nós eramos a piada, mas com 655.000 iraquianos mortos como resultado da nossa invasão - segundo a Universidade John Hopkins - eu acho que a piada de mau gosto agora é deles. Pelo menos eles foram libertados, permanentemente.

Por isso não quero ouvir nenhuma outra palavra sobre enviar ainda mais tropas (acorda Estados Unidos, John McCain está maluco!), ou sobre "realocá-las", ou esperar mais quatro meses para começar a " vencer o prazo" delas.

Só existe uma única solução e ela é simples: retirada! Agora. Comecem hoje à noite. Vamos cair fora de lá o mais rápido que pudermos.

Quanto mais pessoas de boa vontade e consciência não quiserem acreditar nisso, quanto mais mortes nós teremos para aceitar a derrota, nada poderemos fazer para reparar o dano que cometemos. O que aconteceu, aconteceu.

Se você dirigiu bêbado, atropelou e matou uma criança, não haverá nada no mundo que você possa fazer para devolver a vida àquela criança.

Se você invadiu e destruiu um país, lançando o povo a uma guerra civil, não há nada que você possa fazer até que a fumaça dissipe e o sangue derramado seque. Então, talvez, você possa acordar e ver a atrocidade que cometeu e depois ajudar os sobreviventes a tentar melhorar suas vidas.

A União Soviética caiu fora do Afeganistão em 36 semanas. Saíram assim e tiveram perdas pesadas na retirada.

Eles compreenderam o erro que cometeram e removeram suas tropas. Depois, veio uma guerra civil. Os maus venceram.

Mais tarde, nós derrubamos os maus e tudo viveu melhor depois disso. Veja! No fim, a coisa funciona! A responsabilidade pelo fim dessa guerra cabe agora aos democratas. O Congresso puxa as cordinhas e a Constituição diz que só o Congresso pode declarar a guerra. O senhor Reid e a senhora Nancy Pelosi têm agora o poder para colocar um fim a essa loucura. Se fracassarem nisso, a ira dos eleitores recairá sobre eles. Nós não estamos brincando senhores democratas e se vocês não acreditam em nós, toquem em frente e continuem essa guerra por outro mês. Nós lutaremos contra vocês ainda mais forte que fizemos contra os republicanos. A página de abertura de meu site na Internet tem uma foto de Nancy Pelosi e Henry Reid, feitas a partir de fotos de soldados americanos que morreram lutando a Guerra de Bush.

Mas que será a partir de agora a Guerra de Bush contra os Democratas, a menos que alguma outra rápida ação seja tomada.

Essas são nossas exigências:

1 - Tragam as tropas para casa já! Não em seis meses. Agora! Deixem de procurar um meio de vencer. Nós não podemos vencer. Nós perdemos.

Às vezes se perde. Essa é uma dessas vezes. Sejam corajosos e admitam isso.

2 - Peçam desculpas a nossos soldados e façam melhor. Digam a eles que nos desculpem porque eles foram usados para lutar uma guerra que não tinha nada a ver com a nossa segurança nacional. Nós precisamos assegurar que cuidaremos deles e que eles sofrerão o mínimo possível. Os soldados incapacitados fisica e psicologicamente receberão os melhores cuidados e uma compensação financeira significante. As famílias dos soldados que morreram merecem as maiores desculpas e precisam ser cuidadas para o resto das suas vidas.

3 - Devemos nos expiar das atrocidades que perpetramos contra o povo do Iraque. Há poucos males piores que fazer a guerra baseados em uma mentira, invadir outro país porque você quer o que é deles e que está enterrado no solo. Agora muitos mais irão morrer. Seu sangue estará em nossas mãos, não interessa em quem votamos. Se você paga impostos, contribuiu para os 3 bilhões de dólares por semana que gastamos para levar o Iraque para o Inferno onde está o país agora. Quando a guerra civil tiver terminado, nós deveremos ajudar a reconstruir o Iraque.

Nós não podemos nos redimir se não fizermos isso.

Por último, há uma coisa que eu sei. Nós, americanos, somos melhores do que as coisas que fizeram em nosso nome. A maioria de nós ficou estarrecida e zangada com o que aconteceu em 11 de setembro e perdeu a cabeça. Nós não pensamos direito e jamais olhamos um mapa.

Porque somos mantidos na estupidez graças ao nosso sistema patético de educação e à nossa mídia preguiçosa, não sabemos nada de História.

Nós não sabemos que somos os caras que financiaram e armaram Saddam Hussein por muitos anos, inclusive quando ele massacrou os curdos.

Ele era o nosso cara. Nós não sabíamos o que era um sunita ou um xiita, sequer havíamos escutado essas palavras.

De acordo com o National Geographic, 80% dos adultos do nosso país não sabem localizar o Iraque no globo terrestre.

Nossos líderes jogaram com nossa estupidez, nos manipularam com suas mentiras e nos amedrontaram até a morte.

Mas, no fundo, somos um povo de bom coração. Aprendemos devagar, mas a bandeira de "missão cumprida" nos atingiu de modo ímpar e cedo começamos a fazer algumas perguntas. Depois, começamos a ficar espertos. No último dia 7 de novembro, nós ficamos loucos e tentamos consertar nossos erros.

A maioria agora conhece a verdade. A maioria agora sente uma tristeza e culpa profundas e uma esperança de qualquer coisa que seja feita, será melhor e colocará tudo nos eixos.

Infelizmente, não é assim. Então precisamos aceitar as conseqüências de nossas ações e fazer o melhor para que o povo iraquiano possa até pensar em pedir auxílio a nós no futuro. Pedimos a eles que nos perdoem.

Pedimos aos democratas que nos escutem e que saiamos do Iraque agora!

Do seu, Michael Moore