segunda-feira, 11 de dezembro de 2006

Governo de coalizão precisa da força do povo

Jeferson Miola, integrante do IDEA – Instituto de debates, estudos e alternativas de Porto Alegre - jmiola@uol.com.br


A semana que passou foi grifada com uma significativa derrota política do governo Lula, que amargou a eleição do deputado pefelista Aroldo Cedraz [afilhado político de ACM] para o cargo de Ministro do Tribunal de Contas da União [TCU]. No mínimo, foi uma derrota da crença do governo em buscar obsessivamente maioria congressual sem politizar a relação com a ampla maioria social que o elegeu.

Lula pertence à rara galeria de governantes mundiais que ostenta um portfólio de quase 60 milhões de sufrágios populares e uma das maiores votações proporcionais já obtidas no planeta com 61% da preferência do eleitorado nacional. Entretanto, este capital social e eleitoral parece valer pouco na definição da estratégia de sustentação do governo com vistas à implementação das reformas democráticas e populares que o Brasil necessita.

Nesses dias em que a humanidade se livra para sempre do facínora chileno [Pinochet], nunca é demais lembrar a importância de que governos progressistas e de esquerda combinem [i] a adesão do povo que almeja mudanças com o [ii] equilíbrio institucional amplo, que inclui arranjos parlamentares para constituição de maiorias.

Todas as sinalizações de Lula e do PT para a montagem do segundo governo, todavia, evidenciam a persistência do mesmo erro cometido durante o primeiro mandato, em que a governabilidade foi concebida fundamentalmente nos limites da relação com o Congresso Nacional. Não houve equilíbrio [e poderá não haver no segundo mandato] entre a busca de maioria parlamentar e a implementação de formas de deliberação pública e de comprometimento programático na sociedade que poderia ocorrer, por exemplo, com mecanismos de democracia participativa e de outros canais de participação social e de interlocução com os movimentos sociais e de relação com demais agentes políticos sub-nacionais.

A derrota sofrida pelo governo na indicação do Ministro do TCU pode ser encarada como sinal da desarticulação do PT no Congresso e da barganha da base aliada nas negociações, mas não pode ser recusada enquanto demonstração dos limites de compromissos dos setores partidários da aliança formada no governo de coalizão. Não pode haver confiabilidade absoluta nessa sustentação congressual pelo simples fato de que não haverá 100% de fidelidade dos novos aliados com as propostas do governo - mesmo que hoje a feitura das alianças ocorra a partir da pactuação transparente e de “bases programáticas” [expressão de dirigentes do PT], porque são grandes as contradições programáticas com os partidos da coalizão.

Alianças parlamentares para sustentação de um governo de esquerda se justificam quando ajudam a concretizar os compromissos programáticos e as mudanças que superem as desigualdades e as graves injustiças sociais do país. Podem ser mediações políticas que ajudam a concretizar o projeto do governo; mas jamais se pode iludir com a idéia de que após constituídas se bastam em si mesmas. É essencial, junto com a viabilização de maioria de apoio do governo no parlamento, o estabelecimento de estratégias de irradiação da participação popular nos rumos e no controle do governo e do Estado.

O povo organizado, consciente e participante pode ser o aliado fundamental para que o parlamento e os parlamentares possam desenvolver políticas de interesse do país e da maioria da sociedade. O povo pode ser, também, o mais fiel sujeito político capaz de obstruir as tentativas da direita e do conservadorismo em desestabilizar e destituir o governo Lula. Se não existir equilíbrio entre a sustentação congressual e a relação organizada com a sociedade, o governo poderá ter prejuízos importantes. No primeiro mandato, mesmo sem nunca ter necessitado maioria de 2/3 no Congresso o governo cedeu tudo à chamada base aliada, que não evitou a derrota para a presidência da Câmara dos Deputados e também não impediu as CPI´s ilegais montadas pelo conservadorismo tucano-pefelista para atacar implacavelmente Lula e o governo com o apoio do oligopólio midiático. Esta é uma lição que deve ser levada em consideração.

Um comentário:

Claudinha disse...

Oi, Biruta! Esta contradição entre sufrágios dados ao presidente e dados aos congressistas, é que mela o governo, ou seja, o povo vota num candidato, mas não elege, junto, base de apoio. Com um Congresso dessa "monta", associado a um ministério parecido, fica difícil criar os mecanismos democráticos populares, os fóruns de participação direta. Quem votará a favor de tais instituições, caso e executivo encaminhe o PL? Isto só bem demonstra o quanto precisamos avançar no processo democrático, com a criação de partidos fortes, ideologicamente posicionados, novas regras eleitorais, condições eqüânimes de disputa (entre eles, o financiamento público das campanhas e a democratização das comunicações). Abraço e vamos à luta, porque estes próximos quatro anos prometem!