Publicado
na Agência Carta Maior, http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=6183
Jeferson
Miola
A União Européia é a
terceira potência econômica do mundo, mas suas elites conservadoras a colocam
no 201º lugar em matéria de dignidade e civilidade. Acabam de promover uma ação
que escandaliza não só por ofender o ordenamento jurídico internacional, mas
por revelar a vassalagem da elite europeia aos caprichos imperiais dos EUA. Frente
à hiperpotência dominante, se mostraram uma hipocolônia submissa.
Os dirigentes da Itália,
França, Espanha e Portugal proibiram o avião do Presidente do Estado
Plurinacional da Bolívia, Evo Morales - que retornava da Rússia depois de
participar de um encontro de países exportadores de gás -, de sobrevoar os
respectivos espaços aéreos dos seus países, por suspeita de estar dando carona
a Edward Snowden.
Colocaram a vida do maior
mandatário da Bolívia em risco, cometendo o crime de tentativa de magnicídio. O
governo de François Hollande, embora tenha autorizado o plano de vôo do avião
de Evo em 27/06, cancelou a autorização quando a aeronave já se aproximava do
espaço aéreo francês ontem, 02/07, obrigando o avião presidencial fazer um
pouso emergencial em Viena, na Áustria.
O “preço de captura” de Edward
Snowden vale o atentado contra um presidente de uma nação latino-americana
porque ele é um cidadão estadunidense que foi técnico da CIA, depois trabalhou
para uma empresa prestadora de serviços de segurança e espionagem para a CIA e denunciou
ao mundo que seu país [EUA] bisbilhota e controla o tráfego de informações da
telefonia, internet e redes sociais em todo o planeta.
François Hollandé é daquelas
lendas urbanas criadas pela mídia faceira e colonizada. Assim como com Barack
Obama, que se revelou uma decepção monumental correspondente às ilusões
superlativas da sua eleição, com François Hollande se sucedeu
o mesmo. O alívio subjetivo do povo francês com o fim do período soturno de
Sarkosy gerou mais que expectativas positivas com a vitória de Hollande, mas
uma verdadeira miragem dum deserto previsível da tradição conservadora do
Partido Socialista Francês, que é parte da equação neoliberal da Europa, e não
alternativa a ela.
Hollande, subserviente, se
agachou ante a hiperpotência que espia ilegalmente seu próprio povo através do Facebook, Google, Skype, Youtube, Twiter. Desonra a França do iluminismo, da ilustração, da
racionalidade, das luzes, da democracia. E mancha a história do país com as
marcas do obscurantismo obssessivo-paranóico dos EUA.
A Presidenta Dilma correspondeu
ao gigantismo moral deste Brasil que “não
fala fino com Washington, nem fala grosso com a Bolívia e Paraguai”, como
afirmou Chico Buarque, e expressou a “indignação e
repúdio ao constrangimento imposto ao Presidente Evo Morales por alguns países
europeus, que impediram o sobrevôo do avião presidencial boliviano por seu
espaço aéreo, depois de haver autorizado seu trânsito”.
Afirmando que essa “atitude
inaceitável é grave desrespeito ao Direito e às práticas internacionais e às
normas civilizadas de convivência entre as nações”, a nota da Presidenta
Dilma completa que “causa surpresa e
espanto que a postura de certos governos europeus tenha sido adotada ao mesmo
momento em que alguns desses mesmos governos denunciavam a espionagem de seus
funcionários por parte dos Estados Unidos, chegando a afirmar que essas ações
comprometiam um futuro acordo comercial entre este país e a União Européia”.
E, finalizando, diz que “o
constrangimento ao Presidente Morales atinge não só à Bolívia, mas a toda
América Latina. Compromete o diálogo entre os dois continentes e possíveis
negociações entre eles. Exige pronta explicação e correspondentes escusas
por parte dos países envolvidos nesta provocação”.
A manifestação do governo brasileiro honra a grandeza do país e reforça seu
papel ativo na construção de um mundo multipolar, com paz, respeito às
soberanias, liberdade de expressão, sem impérios, sem imperialismos e sem
colonialismos. O Brasil bem que poderia conceder o asilo político solicitado
por Edward Snowden - daria um salto na afirmação desses valores e na liderança
positiva do Brasil na região e no mundo.
Fossem outros os tempos, como na época de FHC, aquele
Brasil colonizado e subserviente não só falava fino com Washington, como
sofria a humilhação de ver seu Chanceler tirar o sapato em procedimento de
revista para poder ingressar nos EUA em missão oficial!
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