terça-feira, 18 de agosto de 2009

O fator Marina

Jeferson Miola

Anunciaram e garantiram
Que o mundo ia se acabar;
Por causa disso a minha gente
Lá de casa se botou a rezar ...

“E o mundo não se acabou”, Adriana Calcanhoto [letra Assis Valente]

Para além da guerra de bugios que domina o noticiário de Brasília, um movimento de grande impacto ganha contorno nos bastidores da política nacional: a preparação da candidatura presidencial de Marina Silva pelo PV.

Enquanto os holofotes se concentram no lodaçal do Senado, a mídia pouco repercute o frisson político gerado por tal hipótese. Mas o clima é o que em física se chama “estado de ebulição”. A razão é ponderável: a candidatura Marina embaralha o jogo eleitoral de 2010, tido até então como a reedição do confronto PT versus PSDB.

A cada dia multiplicam-se as operações políticas visando dissuadí-la da decisão de candidatar-se. Ato, aliás, que implicaria sua saída do PT. Além de afetar eleitoralmente a candidatura Dilma, também teria o efeito colateral de animar a conhecida aspiração de Ciro Gomes, significando mais dispersão eleitoral na base do Governo Lula. O peso real que terá nas eleições, contudo, é incerto e ainda difícil de ser aferido.

Mesmo se não confirmar a candidatura, a mera cogitação de Marina Silva como candidata abre, por si, o debate a respeito da dimensão ecológica e ambiental no desenvolvimento do país. É um debate crucial e inadiável, porque estamos diante duma ameaça concreta à civilização humana em decorrência da devastação acelerada do planeta. Até 2001, cientistas previam que a persistência do padrão predatório de produção e consumo do sistema capitalista ocasionaria importantes catástrofes no mundo nos próximos séculos. Nos últimos anos, todavia, as previsões científicas anteciparam os sombrios prognósticos já para os próximos 30 anos ou até antes deste prazo.

O Brasil não está fora deste preocupante roteiro, porém possui condições privilegiadas em todos os aspectos. O país pode, por isso, liderar a aplicação de estratégias de desenvolvimento sócio-ambiental de efeito exemplar para todo o mundo. Com a consciência, entretanto, de que os conceitos desenvolvimentistas e produtivistas fazem parte do problema, e não das soluções requeridas nesta época de dramática crise civilizacional e de comprometimento da própria existência humana no futuro próximo.

A dimensão ambiental é, cada vez mais e de modo imperativo, indissociável da economia, da cultura, da moral e da política. Por esse motivo, necessita ser incorporada ao raciocínio acerca de uma outra nação, uma outra economia, uma outra cultura e uma nova organização da sociedade. Devem ser inventadas formas aceitáveis de produção e consumo para a satisfação das necessidades humanas com racionalidade e equilíbrio. O capitalismo e as antigas experiências do leste europeu – em verdade duas inteirezas do mesmo equívoco - demonstram-se modelos histórica e humanamente fracassados diante deste desafio.

O melhor dos mundos para o PT é a permanência de Marina. Em qualquer cenário, no entanto, Marina já se tornou o fator diferencial do período. A agenda sócio-ambiental finalmente assumirá a centralidade que nossa época exige. Até por uma questão de sobrevivência.

4 comentários:

Gelso Job disse...

Bom ouvir teu comentário. A tempos não andavas por aqui. A dimensão ecológica é sim urgente e relevante, porém neste momento temos que decidir o que é mais importante para avançarmos. Abração.

Omar disse...

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Biruta do Sul disse...

Muito interessante a tua análise, Jefferson. Para engrossar o caldo, penso que uma candidatura de Marina enterraria de vez o fator Heloisa Helena e o da eterna rotação do PSOL para a direita no segundo turno.
Marina também come uma parcela, ainda que pequena, dos possíveis votos de Serra, daqueles e daquelas que nào querem votar em HH, nem em Dilma do PT, mas que não se entusiasmam pelo pouco carisma de Serra. E seria um barato se tivéssemos um segundo turno entre Marina e Dilma. Aí sim, haveria espaço para um debate interessante sobre desenvolvimento sustentável, ao invés das baixarias que a imprensa convencional vai fazer e já está fazendo para favorecer Serra.
Flávio, de Berlim.

Claudinha disse...

Pois é, mas eu me pergunto, até que ponto o PV ou qualquer outro partido que venha a se coligar com aquele, tenha um projeto de Estado diferente do que os demais partidos que disputam em 2010.
De fato, precisamos de um novo modelo que dê conta de uma outra nação, uma outra economia, uma outra cultura e uma nova organização da sociedade, mas quando se faz o balanço das antigas alianças políticas do PV, duvida-se de sua capacidade de transformação.
Mas o PT deixa essas beiradas para a divisão. Um governo que só mantém a política de conciliação de classe, dá nisso. Começo a acreditar, que covardia ganhou outro nome: "correlação de forças".
Está mais do que na hora, do Pres. Lula chegar para seus Ministros e dizer: "estamos aqui, em função dos nossos 60% de votos em 2006; temos reconhecimento internacional; e, o mais importante, temos a chave do cofre e da cadeia".
Quem sabe, desta forma, a turma do poder econômico reconhecesse que não está pobre e pudesse diminuir a ganância...
O desgaste interno seria menor. Perder aliados, pensando angariar inimigos, é de uma cegueira sem tamanho!
Bom te ver escrevendo! Tens muito a colaborar com a blogosfera. Sabias que estamos incomodando? Lê o Diário Gauche do dia 18/08!
Claudia.