sexta-feira, 23 de março de 2007

E agora, qual o plano?

Durante muito tempo do primeiro mandato do presidente Lula, os petistas e o conjunto da esquerda brasileira confiavam, incrédulos, que por detrás das opções conservadoras adotadas pelo governo havia algum “plano secreto” de Lula e da então direção do PT. Plano esse que, decerto, levaria o país ao encontro com seu destino de justiça, igualdade, democracia e distribuição de renda.

Era crível se supor, à época, a existência de alguma estratégia inteligente que pudesse justificar tanto a busca desmedida por apoio congressual, como a coabitação das forças de centro-direita e direita num governo capitaneado pelo PT, eleito com mais de 52 milhões de votos. A realidade, contudo, demonstrou não só não haver nenhuma estratégia - menos ainda inteligente -, como também expôs a falta de um raciocínio sobre a contraditória realidade do Brasil e acerca da complexa dinâmica política, cultural e social do país e dos interesses fundamentais em disputa na sociedade brasileira.

Somente agora, decorridos três meses desde o início do segundo mandato, o presidente conclui a montagem do ministério, alicerçado numa amplíssima aliança partidária. A fotografia da esplanada dos ministérios exibe a heterodoxa constelação onde coexistem, lado a lado, o PT e seus históricos aliados juntamente com setores peemedebistas que até ontem integravam o raivoso bloco tucano-pefelista de oposição. Sem esquecer ex-ministros e integrantes dos governos Sarney, Collor e FHC e também os personagens que atuaram na linha de frente na ditadura militar, que hoje são “conselheiros do Planalto”.

A equação aliancista do governo tem o mérito de isolar política e institucionalmente o principal pólo reacionário do país, estruturado em torno do PFL e do PSDB. Também evitará, como se viu nesses dias, obstáculos e dificuldades no Congresso, eleito como o locus principal de apoio do governo em detrimento da sustentação social decorrente da democratização radical do Estado. A aliança governamental estará dificultando, também, a volta ao poder de Estado em 2010 daquele campo ideológico que produziu políticas destrutivas para o país. Lula busca, desse modo, assegurar sua sucessão em termos favoráveis para, quem sabe, poder conquistar um terceiro mandato em 2014 – um sonho pessoal de consumo de quem “surfa” no “lulismo”, um fenômeno acima e à parte dos partidos políticos, inclusive do próprio PT.

É notório que a formação da aliança se baseou em critérios distintos dos aplicados no primeiro mandato, e dessa vez o governo buscou o compromisso institucional e político dos partidos com o PAC. Isso é importante, mas ainda está longe de informar uma fisionomia programática e ideológica nítida do governo Lula II, pois o PAC nada mais é que uma espécie de glossário de obras do plano plurianual de investimentos que o governo constitucionalmente é obrigado a apresentar para definir metas e ações do próximo quadriênio.

Os petistas, a esquerda brasileira e a imensa maioria do povo que elegeram Lula aguardam atitudes e programas do governo que condensem uma idéia de nação e de futuro decente para o povo brasileiro, muito além da mística do PAC. Mesmo que o governo seja composto com tal amplitude partidária e ideológica, o mínimo que se espera é a apresentação de perspectivas estratégicas com reformas democráticas e realização de políticas voltadas ao social para a superação das indignas disparidades existentes no país.

Sem esse delineamento programático estratégico, corre-se o risco de que os petistas - tal como muitos dos demais integrantes da aliança governamental – tristemente conduzam ministérios como capitanias hereditárias: preservando empregos, cargos e fatias do poder.

Já não há mais incredulidade e estupefação. Os últimos anos de “irrelevância da política”, na expressão de Francisco de Oliveira, balançaram sonhos e esperanças muito antigos, que hão de ser renovados no futuro. Ninguém espera um “plano secreto”. Mas, diante da arquitetura de poder do governo Lula II, o desejável seria que ao menos fosse explicitado: e agora, qual o plano?

2 comentários:

Claudinha disse...

Biruta, que bom o teu retorno! Se por um lado, tua argumentação sobre a composição dos ministérios ajuda a entender a estratégia de neutralizar o poder do PSDB e PFL no Congresso, por outro lado expõe a fragilidade de uma composição com o PMDB, este saco de gatos, que não será garantia de um governo tranqüilo e fechado em torno do PAC. Tenho minhas dúvidas em relação à tamanha fidelidade, pois cresci, ouvindo a máxima de que "não se dá chances ao inimigo". Ao mesmo tempo, tal composição só se dá, na medida em que o povo brasileiro não garantiu, ao Presidente, base partidária no Congresso, ou seja, votou no Lula, mas não nos políticos do PT e aliados. Mais: já havia expressado o meu medo de que tenhamos, em POA, uma chapa para a prefeitura entre PT e PMDB. Dada as condições nacionais, alguém duvida? Abraço!

Jean Scharlau disse...

Pois o que tu e a Claudia disseram está certo. Acrescento que depois dos baratinhos deputados do mensalão (que já não são mais possíveis, senão legalmente), o PMDB é uma opção muito mais cara, mas a única - ou seja, o noivo, exposto ao olho da sociedade, teve que largar as putas e firmar noivado. É claro que não o faria com a miss PSDB, nem com a rica PFL.

Mas acho que não temos que dar muita atenção a essas firulas e compromissos sociais (no sentido piorzinho), nem perguntar ao noivo qual é o plano. O plano é o mesmo de sempre, e nós, que somos os velhos companheiros do nubente, temos que GARANTIR que os planos sejam cumpridos, independente do que pretenda a noiva. Não achas?