Jeferson Miola
Fracasso retumbanteO governo de Yeda Crusius é, inapelavelmente, um retumbante fracasso. Um governo que, em verdade, se confunde com uma farsa, auto-inviabilizada desde muito cedo. Símbolo dessa realidade foram as demissões de secretários antes mesmo de tomarem posse, ainda em dezembro de 2006. O governo tucano que é, todavia, adornado com a plumagem pluripartidária do PMDB, PP, DEM, PTB e PPS, inaugurou uma etapa tenebrosa e sem precedentes na política gaúcha.
A alta rotatividade de secretários demitidos é um recorde sem concorrência em toda a história do Rio Grande. A opção pelo conflito e pelo enfrentamento permanentes são a preferência da Governadora e de agentes políticos do governo. E tratam-se não só de conflitos com setores da sociedade e do funcionalismo – a condução fascista da Brigada Militar é a maior prova disso – como também de conflitos internos ao próprio governo, caracterizado na ruptura entre a Governadora e seu Vice-Governador e nas muitas demissões de Secretários por desavenças.
Quanto aos compromissos eleitorais, é um governo que fraudou as principais – senão todas - promessas. O tal “novo jeito de governar” confirmou-se como uma mera empulhação de época de eleição, substituído pelo autoritarismo, falta de diálogo, truculência, violência e suspeitas de corrupção. A mentira de equilibrar as finanças sem aumento de impostos foi desmascarada duas semanas após as eleições com a tentativa frustrada de manter as alíquotas de ICMS elevadas.
O programa de irrigação, alardeado como solução milagrosa para todas as mazelas do Rio Grande, não saiu do papel porque na realidade nunca existiu, apesar da Governadora ter criado uma Pasta específica para a área. Nas áreas sociais, para as quais a candidata prometia o nirvana ao povo gaúcho, promoveu o desfinanciamento com conseqüente desmonte de estruturas e serviços públicos essenciais.
O polêmico projeto de prorrogação dos contratos de pedágio é um caso raro de compromisso de campanha que está sendo mantido – sabe-se lá quais possam ser as razões para tal “fidelidade programática”. Este foi, aliás, um ponto inexplorado no debate eleitoral de 2006, que fora apresentado no programa da então candidata Yeda Crusius eufemisticamente como “Novos Equilíbrios para os Pedágios de Consórcios que diminuam o custo para o usuário de automóveis e ônibus.” [Item 4 do Capítulo Transportes e Sistemas Logísticos, página 15].
A repactuação da dívida pública do Estado seria uma medida meritória em meio ao oceano de desastres, não fosse a enorme variação cambial, que não só gerará novos encargos à dívida, como também prejudicará as finanças públicas no médio prazo. É de se sublinhar, neste caso, a inconsistência gerencial e a imperícia do governo, que não adotou as cautelas recomendáveis principalmente em se tratando de contratos indexados por moeda estrangeira, tendo arrogantemente desprezado alertas neste sentido.
Uma mirada realista para o governo Yeda, portanto, alude a uma situação de desastre político e administrativo; dum fracasso incontestável. Julgamento que vale tanto para as áreas específicas como em relação ao conjunto da “obra”. É uma das experiências mais fracassadas de governo no Rio Grande do Sul devido aos métodos empregados para governar, às opções e às políticas empregadas.
Ordem unida contra o PT
Mesmo sendo o fracasso que é, mesmo envolvido em suspeitas de corrupção, mesmo produzindo crises quase diariamente, instabilidades, desatinos, conflitos e violência, o governo Yeda consegue conservar sustentação parlamentar, política e midiática. Pela razão fundamental de que este é o governo do conservadorismo – do PSDB, PMDB, DEM, PPS, PTB, PP -, da direita econômica gaúcha e da mídia conservadora, e porque seu eventual soçobramento beneficiaria naturalmente o PT e a esquerda.
Em 2006, diante da hipótese de eleição de Olívio Dutra e do retorno da opção democrático-popular na condução do Palácio Piratini, a direita gaúcha – política, empresarial e midiática – preferiu a aventura desastrosa de Yeda. Era um desastre anunciado. A crônica política sabia, os pássaros sabiam, todos sabiam que Yeda não representava mais que bordões e clichês vazios, fantasiosos, destituídos de sentido. Ela transformou a política num fetiche e intencionalmente despolitizou a política para poder criminalizar seu oponente do segundo turno que fez política e a disputa eleitoral com seriedade e decência.
A política no Rio Grande do Sul, nos últimos anos, tem sido assim: constrói-se uma união não a favor do Estado e do desenvolvimento, mas uma união contra o PT; contra a possibilidade do PT voltar a ocupar posições de destaque no poder e equilibrar o jogo político regional. Mesmo que o PT eventualmente porte as melhores idéias e propostas para o desenvolvimento e para o progresso, encontram formas de demonizá-lo e satanizá-lo como um mal a ser evitado. Fazem do combate ideológico do PT uma religião monoteísta.
Em artigo neste espaço analisando o abafamento do impeachment da Governadora, foi dito que o reacionarismo gaúcho “não quer o melhor para o Rio Grande, mas sim conservar os seus melhores interesses e privilégios. Eles não pensam no que poderia melhorar a vida de todos, mas naquilo que não atrapalhe os seus objetivos. Eles não fazem política a favor de alguma coisa, mas contra o PT. Eles sempre optam por planos para derrotar o PT, e nunca por projetos para governar o Estado ou as cidades - mesmo que os planos contra o PT sejam prejudiciais ao povo e ao futuro, e mesmo que os projetos do PT sejam o melhor para a sociedade. Muitos deles fazem política com ódio e preconceito contra o PT, e têm medo daquele PT autêntico e programático que operou importantes transformações em Porto Alegre e no Rio Grande do Sul. Foi assim que elegeram Yeda, com a idéia fantasiosa, mítica e vazia do “novo jeito de governar”; a reedição estadual da fraude “nirvanesca” que aplicaram com Fogaça em Porto Alegre para derrotar o PT. O Rio Grande e Porto Alegre ficaram pior com eles, mas como o que lhes interessa é ‘tirar’ o PT e não deixá-lo voltar, então para eles a coisa está boa e deve continuar, mesmo que a população os repugne.” [Eles têm medo de quê? - Biruta do Sul, 19/06/2008].
A melancolia até o fim
O governo Yeda é, neste final de 2008, o alívio de ter já passado metade do mandato, mas o fardo de ter outra metade que, tudo indica, será de um vazio político até o encontro com seu fim melancólico. Ao que parece, a segunda parte do governo tende a ser a reedição duma Yeda Crusius descrita em 1993 por um conhecido colunista gaúcho quando a então Ministra do Planejamento de Itamar vagava na Esplanada dos Ministérios em Brasília sem poder e cumprindo papel ornamental: “um ente ficto, um ectoplasma tecnocrático, uma utopia dirigencial, uma avacalhação mais completa ...”.
Não seria implausível, contudo, que com a eventual abertura do estoque de escândalos pendentes que ficaram suspensos do debate público durante o período eleitoral – a começar, por exemplo, pela elucidação das condições de compra da casa da Governadora -, se retome uma conjuntura de maiores enfrentamentos e questionamentos da continuidade deste governo.
Antecipação do clima eleitoral de 2010
O fracasso do governo Yeda, por mais retumbante que seja, não significa, em nenhuma hipótese, que o bloco conservador, que é herdeiro e partícipe deste governo fracassado, está antecipadamente derrotado na sucessão de 2010. Os próprios “sócios” do desastre, o PMDB em proeminência, por ora avaliam ser conveniente permanecer no governo a abandoná-lo, apesar da caracterização negativa que dele se faça e dos péssimos índices de aprovação popular que ostenta.
As razões para se manterem juntos transcendem às conveniências parasitárias na máquina estatal, confessadas pelo ex-Chefe da Casa Civil de Yeda nas gravações de conversas mantidas com o Vice-Governador. É que este é exatamente o mesmo bloco social, econômico, partidário e midiático que vem polarizando com a alternativa de esquerda no Rio Grande do Sul pelo menos desde a eleição estadual de 1994, e que estará novamente unido em 2010. Além disso, são importantes os indícios de força desses partidos nas eleições municipais, sendo o PMDB o de maior visibilidade, com vitórias na capital, em Caxias do Sul e em outros centros urbanos de importância regional.
Se o coesionamento e a unidade de todo o conservadorismo em torno do governo Yeda é um fato contingente, a antecipação dos raciocínios eleitorais é outra imposição circunstancial do presente contexto político. O fracasso do governo forçosamente antecipa as equações com vistas às eleições de 2010, com a tendência de que o PMDB e o PT galvanizem o debate sucessório, mesmo que o PSDB tenha recentemente afirmado a candidatura re-eleitoral de Yeda.
O PMDB, alinhando do centro e centro-direita à direita do espectro partidário, reproduzindo o mesmo campo de alianças de quando governou com Britto e depois com Rigotto – nas duas vezes tendo o PSDB na vice-governança. E o PT, buscando alinhar posições do centro e centro-esquerda à esquerda, se esforçando para assegurar a companhia do trabalhismo e dos aliados históricos.
O PT tem boas chances de reconquistar o Piratini nas eleições de 2010, e essa é uma tarefa prioritária para que o partido e a esquerda gaúcha, governando o Rio Grande com políticas inovadoras e populares, possam recuperar capacidade de disputa hegemônica na sociedade gaúcha. Seria bom se o PT conseguisse emplacar, já no início de 2009, um planejamento estratégico com o objetivo de avançar na construção de relações partidárias e com setores da sociedade, das bases programáticas, de alianças e da melhor indicação de candidatura dentre os importantes e experientes quadros que o Partido pode oferecer para a construção de um projeto progressista, democrático e popular no Rio Grande do Sul.
Tomara que a reiterada ausência de balanços políticos de parte do PT – nestes dias, por exemplo, completa o primeiro mês da eleição em Porto Alegre sem que os filiados e simpatizantes da sigla sejam brindados com avaliações sobre o processo –não tem anule a capacidade de aprender-se com os processos equivocados do passado.
A legítima ambição de vencer em 2010 para desenvolver o Rio Grande e para melhorar a vida do povo gaúcho demanda um trabalho de diálogo, compreensão, consensos e muita unidade política interna que demanda, em última instância, tempos, ritos e processos políticos de qualidade distinta da que o PT vem se valendo nos últimos anos.
Se quiser vencer em 2010, a opção que se organizará em torno do PT não poderá resultar de invenções de última hora ou de arranjos determinados por processos internos dilacerantes e esterilizadores de força política. É fundamental que já ao raiar de 2009 iniciem-se os esforços e processos para a construção do que poderá ser a possibilidade concreta da vitória em 2010: um programa, amplas relações na sociedade, alianças coerentes e a mais potente candidatura.
Um comentário:
Oi Jeferson,
Concordo contigo.
Acredito que práxis talvez esteja sendo necessária.Um discurso de quem compõe o Partido dos Trabalhadores pela unidade, objetivo comum, convergente aos ideais de democracia e solidariedade em suas ações internas e externas.
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